A vitalidade da natação master

Foto: Arquivo Pessoal

"Dona Nora, a senhora se importa de tirar uma foto comigo?"
Ela sorriu, embaraçada, levantou-se da cadeirinha e pegou minha mão. Até a terceira (e única bem sucedida) tentativa de foto, não a soltou. Senti como se passasse um pouco da sua energia, determinação e perseverança pra mim.

Dona Nora Ronai tem 90 anos de idade. Imagino que muitos leitores a conheçam, inclusive. Esta foto foi tirada no último fim de semana em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, onde acontecia o 54º Campeonato Brasileiro Master. Alguns minutos antes do registro, ela tinha nadado os 200m borboleta, uma prova que eu, com menos de 30 anos, não ouso encarar.

Ela, que aos 69 resolveu iniciar na natação competitiva, é o meu maior exemplo esportivo atual. Por que nadar, treinar, viajar, competir, e negar as leis da física, da natureza, de seu corpo?

Dona Nora sorri, e enruga mais o rosto marcado por mil histórias. Nem cito que, de família judia, deixou a Itália na década de 40 para fugir da Segunda Guerra Mundial e do fascismo. Ou que encontrou na piscina conforto pra ausência do marido, para evitar afundar em sofrimento pela perda do companheiro.

Vou falar que ela baixou em um minuto, nada menos que isso, o recorde mundial dos 400m medley, estabelecendo pela primeira vez marcas brasileira e sul-americana, porque ninguém no continente havia se atrevido a encarar a prova com essa idade.

Dona Nora sobe no bloco sozinha. Salta para a piscina ao sinal sem precisar sair de baixo. Gosta de nadar provas difíceis, mesmo estando sozinha em sua categoria. Competitiva até em campeonato de cuspe à distância na infância, ela busca sempre novos desafios. Bate recordes e coleciona medalhas como se escolhesse laranjas na feira. Dobra sua touca e guarda seus óculos como se preparasse com muito esmero um bolo para a visita dos netinhos em casa.

Aos 90 anos, dona Nora não solta entre as provas. Enrola-se em sua toalha e volta a se sentar no balizamento, pronta para nadar o revezamento e, depois, encarar os 50m borboleta.

De coração brasileiro e inabalável pelo tempo, as mãos enrugadas de Nora Ronai fecharam a mochila depois de pentear os alvos cabelos molhados, recém-saídos da piscina.

– Dona Nora, não vai soltar?

– Ah, querida, agora só solto na próxima prova, no Brasileiro do ano que vem! – e sai dando risada.

Por Mayra Siqueira

Foto: Reprodução