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Entrevista exclusiva: Aaron Peirsol

swimchannel

24/12/2013 05h00

O maior nadador de costas da história? Para muitos, isso bastaria para definir o americano Aaron Peirsol. Um dos nadadores mais vencedores da história da natação, tem no currículo nada menos que sete medalhas olímpicas (cinco de ouro) e dezesseis vitórias em mundiais, contabilizando piscinas curta e longa. Apesar de ter encerrado a carreira há quase três anos, ainda detém os recordes mundiais dos 100m e 200m costas. Nos 200m, tem o recorde desde 2002, com apenas um breve período de perda do recorde para Ryan Lochte. Travou grandes duelos não só com Lochte, como também com Michael Phelps. Este, aliás, dificilmente conseguia uma vitória contra Peirsol quando arriscava em provas do nado de costas.

Sempre foi visto como um nadador cool devido ao seu carisma e por sobretudo amar a natação e ser um divulgador do esporte. Tanto que, mesmo depois da aposentadoria, continua ligado a esportes aquáticos, principalmente nos mares. Gosta de surfar e de nadar em águas abertas, e tem um projeto de proteção dos oceanos.

Foi a presença mais inusitada no Desafio Rei e Rainha do Mar, realizado na semana passada no Rio de Janeiro. Entre tantas estrelas das águas abertas, como Poliana Okimoto, Keri-Anne Payne e Valerio Cleri, todos campeões mundiais, ele aceitou o desafio, mesmo distante das competições há algum tempo. Atraiu holofotes não só do Brasil, como de todo o mundo da natação.

Durante sua passagem pelo Brasil, concedeu uma entrevista exclusiva à Swim Channel. Revelou-se um grande conhecedor da história de seu esporte e, como não poderia deixar de ser diferente, mostrou seu lado de amante dos mares e das águas.

Swim Channel: Quais são suas impressões dessa edição do Rei e Rainha do Mar?

Peirsol: Achei muito bom, o conceito foi ótimo. Por alguma razão, nunca tive oportunidade de vir à América do Sul, não tenho certeza porque. E essa foi uma grande oportunidade para mim. Amo nadar em águas abertas. O formato foi espetacular, fez os atletas se divertirem muito.

SC: Gostaria de voltar para nadar novamente?

Peirsol: Adoraria estar de volta no ano que vem, seria fantástico. Adorei tudo que aconteceu e valeu muito a pena ter vindo.

SC: O que achou do Rio de Janeiro?

Peirsol: Amei a energia da cidade. A cidade me pareceu muito viva, muito rica em termos culturais. Gostaria de ter visto muito mais. Preciso reservar mais tempo para isso. Ficamos um pouco restritos e sei que há muito mais para ver. Mas isso por causa da correria da competição. Me interesso pelo que acontece nas favelas, pois vim do subúrbio. É uma coisa diferente do que temos nos Estados Unidos. Adoro conhecer culturas diferentes, ouvir a música, ver a dança, todas essas coisas. Talvez da próxima vez.

Aaron Peirson, no Desafio Rei e Rainha do Mar (foto: Daniel Takata)

SC: Você é um embaixador dos oceanos e inclusive organiza a Race For The Oceans para divulgar a causa de defesa dos mares. Pode nos falar um pouco sobre isso?

Peirsol: Para mim, a ideia é manter os oceanos como quando eu era mais jovem, ou até melhores. E entender que eles nao são necessariamente meus, ou nossos, mas sim de todos, e para todas as gerações. É tentar pensar para além do momento presente e mantê-los sustentáveis. Não podemos abusar. Precisamos tratá-los bem. Há muitas pessoas no mundo. Precisamos ter cuidado ao usá-los, pois pode chegar um ponto em que eles podem não ser usáveis como eram antes. Podemos pensar que eles são infinitos e inesgotáveis, mas não são. Todo mundo pode melhorar nesse ponto. Percebo que as pessoas vêm se tornando mais conscientes.

SC: Mesmo após o término de sua carreira, você continua ligado à natação. Certa vez entrevistamos Gary Hall Jr e ele disse que era muito mais um competidor do que um nadador. Parece-me que você é o contrário. O quanto avalia seu envolvimento com a natação nos últimos tempos?

Peirsol: Tenho me mantido bastante envolvido. Às vezes para divulgação do esporte, às vezes com companhias com as quais me envolvo em termos de patrocínios…. Basicamente estando do outro lado em vários níveis. Estou na comissão de atletas da FINA, em comitês no meu país, esse tipo de coisa. O que destaco é a visão que desenvolvemos a partir do esporte. Isso começa na juventude, e o desenvolvimento dessa perspectiva é muito importante, especialmente em crianças e jovens. É bom trabalhar duro… tantas pessoas na natação trabalham duro, certo? É bom ser inteligente, é bom aproveitar. É bom ter um balanço. É bom saber porque você nada. Você pode ter diferentes relações com a água, o importante é aproveitar. Pode ser no mar, em um rio, em um lago, você pode surfar, pode praticar saltos, pode nadar, há muitas coisas que você pode fazer. E para os nadadores, é bom que eles percebam que a natação não acaba quando a carreira termina. Há outras coisas que podem fazer. Não precisam parar após os 20 e poucos anos. Você pode desenvolver a natação de outras formas, que podem ser muito boas e divertidas.

SC: Qual considera seu maior feito na natação?

Peirsol: Não tenho certeza se uma medalha… Eu diria… Sou feliz por ter sido consistente… Acho que qualquer um pode quebrar recordes mundiais algum dia. Todos têm seus dias bons. Tentei ser consistente e tentei manter as coisas simples e uma cabeça boa. As medalhas e esse tipo de coisa são legais, mas gosto de ter uma visão mais ampla. Para mim é muito importante ter sido consistente.

Aaron Peirsol, no pódio dos 100m costas em Pequim-2008 (foto: AP)

SC: Torce para que seus recordes mundiais sejam quebrados?

Peirsol: Sim. Eles não irão durar para sempre. Não irão. Quando isso acontecer, espero estar presente. Seria legal.

SC: E deseja que sejam quebrados por um americano?

Peirsol: Não, não sou parcial nesse sentido. Seria legal se fosse alguém humilde, sabe? Quero que o esporte se perpetue de uma maneira boa. Há muitas pessoas boas por aí. Ficaria feliz por qualquer um que conseguir. Os recordes não são fáceis, por causa dos trajes de 2009 e aquela coisa toda. Mas logo irão cair, o dos 100m costas com certeza.

SC: Sim, Matt Grevers está muito próximo.

Peirsol: Sim, muito mesmo. Ele chegou muito perto.

SC: E qual considera o momento mais duro de sua carreira? A quase desclassificação após a vitória nos 200m costas na Olimpíada de 2004? (nota: na ocasião, Peirsol chegou a ser desclassificado, mas foi reinstaurado logo depois em decisão polêmica)

Peirsol: Não. Talvez… minha derrota (nos 200m costas) para Ryan Lochte em 2007 (no Mundial de Melbourne).

SC: É mesmo?

Peirsol: Sim. Foi um dos momentos mais difíceis. Talvez não devesse ser, talvez eu não devesse considerar um momento tão duro na época…

SC: Você não estava esperando?

Peirsol: Sim, foi difícil no sentido que eu não estava esperando. Não perdia a prova fazia sete anos e na verdade foi bom eu ter perdido. Fico feliz hoje que aquilo aconteceu. Foi difícil na época, mas às vezes você tem que tomar uma pancada para aprender. Foi bom ter me mantido humilde. Esse é um exemplo. Houve outros momentos difíceis. A quase desclassificação foi difícil em outro aspecto, mas também diria que foi boa, me fez aprender algumas coisas.

SC: A derrota para Lochte foi mais difícil em 2007 do que na Olimpíada de 2008?

Peirsol: Sim, acho que sim. Foi mais difícil em 2007. As duas derrotas foram difíceis… Mas é assim que funciona. É o esporte.

SC: Preciso perguntar isso: por que você não venceu os 100m costas no Mundial de Roma?

Peirsol: Por que não venci?

SC: Sim.

Peirsol: Nem cheguei na final! Não dei tudo de mim na semifinal. Na época o pessoal estava nadando muito rápido. Nadei para 53s baixo e fiquei em nono! Com 53s1! Isso nunca acontece! Em 2004 ganhei a Olimpíada com 54s0! Foi mais uma coisa de eu não ter feito meu trabalho. Errei, culpa minha.

Aaron Peirsol & Swim Channel (foto: Daniel Takata)

SC: Você se considera o maior nadador de costas da história?

Peirsol: Eu não sei… Não sou eu quem deve opinar sobre isso. A história pode ser facilmente esquecida. Vejo o que John Naber fez em 1976, os tempos que ele fez. Ele fez 1min59s, sem óculos, sem touca, bigode, sunga, viradas sem cambalhotas… 1min59s! Muito bom! Em 2000 ainda era um tempo muito rápido! E é difícil comparar diferentes épocas, pois hoje temos mais dinheiro… Se você for tomar como critério a longevidade, não é justo, pois hoje as carreiras são longevas por termos mais dinheiro. Roland Matthes… na época dele, ele era o melhor por muito longe, certo? Você está perguntando para a pessoa errada. Acho difícil argumentar. A não ser que eu fosse o melhor por longe. Mas não é o caso.

SC: Falando em John Naber, você teve ele e outros grandes nadadores de costas americanos como ídolos? Rick Carey, Jeff Rouse…

Peirsol: …Lenny Krayzelburg, Brad Bridgewater, muitos e muitos… Todos eles. Jeff Rouse com certeza, pois é mais recente. Em 1992, quando ele surgiu, eu era bem jovem. Brad Bridgewater também. Lenny menos, pois ele era mais um camarada, é da minha época. Na história, John Naber, Rick Carey, conheço bem todos esses nomes. Martin Lopez Zubero, da Espanha. Kieren Perkins, Daniel Kowalski, fundistas australianos. Há nadadores que respeito muito, não necessariamente nadadores de costas. Afinal eu nem era costista quando era mais jovem. Há vários nadadores em quem me inspirei.

SC: Sente falta das competições?

Peirsol: Não, de verdade. Nada contra as competições, mas estou bem contente apenas nadando. É bom não ter esse elemento para mim agora. Tomando como exemplo Gary Hall Jr, como você disse, ele é mais um competidor, e eu sou mais um nadador. Como você disse, é diferente. Gary tem esse negócio de querer competir. Para mim, está tudo bem.

SC: Para finalizar: quem foi seu maior rival na natação? Lenny Krayzelburg? Ryan Lochte?

Peirsol: Era muito diferente, certo? Lenny era mais como um mentor. Não o considero um rival e sim um mentor. Ryan, não tanto um rival, pois ele não era exatamente um nadador de costas, somente acontecia de nadar provas de costas, mas ele nadava tudo. Gostei muito das provas que nadei contra Phelps, foram divertidas. Meus maiores rivais acho que são da época que tinha 10, 11, 12 anos, pois eram sempre os mesmos caras. Depois, os caras que eu nadava contra ficaram mais esporádicos, Phelps, Lochte… às vezes nadavam minhas provas, às vezes não. Eles tinham outras coisas para fazer. Meus rivais que eu mais me recordo são de quando tinha 10, 11, 12 anos, estou falando sério! Sabia que iria encontrá-los todas as vezes que fosse nadar.

Por Daniel Takata

Aaron Peirsol (foto: AP)

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Sobre o Autor

Daniel Takata
Redator da Revista Swim Channel. Tem colaborado com os principais veículos impressos e eletrônicos sobre natação e vem comentando competições no SporTV.

Guilherme Freitas
Jornalista da Revista Swim Channel e correspondente internacional de imprensa da FINA (Federação internacional de Natação), formado pela FMU e pós-graduado em Globalização pela Escola de Sociologia e Política.

Patrick Winkler
Editor- Chefe da Revista Swim Channel, Colunista da Radio Bradesco Esportes FM. Graduado em administração de empresas na Universidade Mackenzie, e pós-graduado em Gestão do Esporte pelo Instituto Trevisan.

Mayra Siqueira
Repórter da Revista Swim Channel e jornalista esportiva da Rádio CBN. É correspondente da FINA (Federação internacional de Natação) no Brasil e é colunista de natação para o Blog Esporte Fino, da Carta Capital.

Sobre o Blog

A Swim Channel é uma editora formada por nadadores que escreve exclusivamente sobre natação sendo eleita a melhor revista do segmento no mundo inteiro no ano de 2012. Através deste Blog, consegue fomentar noticias diárias aumentando o alcance do conteúdo editorial. Acompanhe entrevistas com atletas e personalidades, cobertura dos principais eventos, análises das diversas áreas relacionadas a nossa modalidade.

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