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Michael Phelps: e agora?

swimchannel

14/04/2014 23h18

Michael Phelps, o maior atleta olímpico da história, está de volta à natação competitiva e disputará um Grand Prix nos Estados Unidos no final do mês. Uma manchete que poderia abalar as estruturas do mundo da natação. Mas não. Justamente porque, se havia uma notícia anunciada no esporte já há algum tempo, era essa.

Há quase um ano, Phelps retornou aos exames de controle para doping, requisito necessário para a volta às competições. Treinando regularmente com seu treinador de sempre, Bob Bowman, Phelps não poderia demorar muito para voltar a competir, se sua intenção fosse as Olimpíadas de 2016. A seleção americana para o Mundial de 2015 será formada este ano, e ele e Bowman sabem que tentar uma vaga para os Jogos do Rio sem passar por testes de fogo internacionais não seria boa ideia. Atletas precisam se expor, estar familiarizados com o ambiente de competição, com seus adversários. Quem não se lembra da alemã Franziska van Almsick, que em 2002 bateu o recorde mundial dos 200m livre e a partir de então se ausentou dos principais campeonatos internacionais (incluindo o Mundial de 2003), dizendo que preferia se resguardar e se preparar para conquistar o ouro olímpico em 2004? Resultado: nenhum pódio individual em Atenas.

Se o retorno de Phelps às competições já era quase uma certeza, algumas questões começam a ser levantadas.

O retorno de Phelps é bom para o esporte? Sem dúvida. Ele não é o nadador mais carismático do mundo, mas suas 22 medalhas olímpicas falam por si só. Elas fizeram dele o nadador mais conhecido e mais bem pago da história. E, consequentemente, o que mais atrai os olhos do público. Fanáticos por natação ou leigos, todos querem vê-lo nadar. Até Londres-2012, nenhum homem havia sido tricampeão olímpico na natação. Em 2016, ele pode tentar ser tetra nos 200m medley e 100m borboleta. Todos querem testemunhar feitos históricos, e vê-lo tentar essas conquistas absolutamente inimagináveis há algum tempo seria fantástico. Patrocinadores e o COI agradeceriam.

Mas qual é o risco para o próprio Phelps? O tiro não poderia sair pela culatra? Teria ele fôlego para encarar novamente uma maratona de treinos que exige um sacrifício olímpico? Ninguém fala, mas e se Phelps não se classificar para a Olimpíada? A imagem de campeão inabalável não seria maculada? Talvez sim. Talvez não. Mark Spitz tentou um retorno às Olimpíadas de 1992 e não conseguiu. Janet Evans fez o mesmo para Londres-2012, com desfecho semelhante. Alexander Popov encerrou a carreira com uma melancólica participação em Atenas-2004. No entanto, eles não são lembrados por esses reveses. E provavelmente Phelps também não o será, caso não seja tão vitorioso quanto antes.

(Alguns podem argumentar que o retorno de Ian Thorpe manchou sua imagem. É verdade. Mas no caso de Thorpe havia muito mais coisa envolvida no seu retorno, como dinheiro, super exposição, depressão. Pode-se quase dizer que o esporte estava em segundo plano. Não é – ou não aparentemente – o caso de Phelps.)

E, afinal, qual é a motivação para ele? O que mais pode querer um atleta que já conquistou absolutamente tudo? Difícil dizer. Pode-se especular que ele não esteja satisfeito por muitos ainda não o considerarem o maior atleta da história, a despeito de suas conquistas incontestáveis (alguns preferem Michael Jordan, outros Pelé, e até mesmo seu contemporâneo Usain Bolt), e que algumas medalhas e recordes poderiam colocar fim a essa discussão. Talvez ele queira mostrar que é capaz de abrir ainda mais seu leque e ser um grande campeão em provas como 100m livre e 100m costas. Ou talvez ele somente queira atender ao desejo de sua mãe, que há algum tempo implorou em rede nacional de televisão que ele continuasse a competir até 2016.

Michael Phelps e Bob Bowman (foto: divulgação)

Mas pode ser que a motivação seja baseada em algo mais nobre. Justamente aquilo que une profissionais e amadores, jovens e veteranos: a vontade de nadar. Ou a vontade de sentir aquilo que somente a natação proporciona. Para alguém como Phelps, que fez isso a vida inteira, deve ser difícil largar de uma hora para outra. E mesmo sendo bem sucedido em outras áreas, quem foi atleta, em qualquer nível, sabe que a sensação de satisfação após um dever cumprido no esporte é difícil de ser igualada. "Se ainda posso ter essas sensações mais algumas vezes, por que não tentar?", deve ter pensado ele.

Por isso, é difícil julgar e avaliar a hora certa para um atleta desse nível se aposentar. Para sua imagem, para a história, para a posteridade, talvez seja mais fácil. Imaginem se Cesar Cielo, após conquistar o ouro nos 100m livre no Mundial de Roma, em 2009, anunciasse a aposentadoria após a premiação daquela prova, abdicando inclusive de nadar os 50m livre na competição? Campeão olímpico e mundial e recordista mundial, já teria alcançado tudo e certamente viraria um herói nacional, originando histórias míticas e lendárias.

Seria o ingresso mais fácil para a posteridade. Mas ao fazer isso, Cielo estaria, de certo modo, vendendo sua alma. Por isso, continua nadando até hoje, e nesses anos experimentou sensações que ele não trocaria por nenhuma outra.

Talvez seja exatamente esse o motivo do retorno de Michael Phelps.

Por Daniel Takata

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Sobre o Autor

Daniel Takata
Redator da Revista Swim Channel. Tem colaborado com os principais veículos impressos e eletrônicos sobre natação e vem comentando competições no SporTV.

Guilherme Freitas
Jornalista da Revista Swim Channel e correspondente internacional de imprensa da FINA (Federação internacional de Natação), formado pela FMU e pós-graduado em Globalização pela Escola de Sociologia e Política.

Patrick Winkler
Editor- Chefe da Revista Swim Channel, Colunista da Radio Bradesco Esportes FM. Graduado em administração de empresas na Universidade Mackenzie, e pós-graduado em Gestão do Esporte pelo Instituto Trevisan.

Mayra Siqueira
Repórter da Revista Swim Channel e jornalista esportiva da Rádio CBN. É correspondente da FINA (Federação internacional de Natação) no Brasil e é colunista de natação para o Blog Esporte Fino, da Carta Capital.

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A Swim Channel é uma editora formada por nadadores que escreve exclusivamente sobre natação sendo eleita a melhor revista do segmento no mundo inteiro no ano de 2012. Através deste Blog, consegue fomentar noticias diárias aumentando o alcance do conteúdo editorial. Acompanhe entrevistas com atletas e personalidades, cobertura dos principais eventos, análises das diversas áreas relacionadas a nossa modalidade.

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